História da violência em Taiobeiras

*Por Levon Nascimento
Às vezes, recorrer ao passado ajuda a iluminar o presente e potencializa os desejos e as ações de diálogo para a construção de um futuro diferente e melhor.

A história da violência em Taiobeiras é tão antiga quanto a própria localidade, muito antes dela ser cidade. Recorro ao clássico Avay Miranda para recontar essa odisseia de dor.

A violência é cultural e estrutural. Passa pela riqueza exuberante de uns e pela pobreza tétrica da maioria ou pela hipocrisia das famílias “de bem”, cujos patriarcas mantinham “mulheres e filhos particulares” desprovidos dos direitos legais reconhecidos às matrizes e aos legítimos.

Também é violência moral, quando a exploração sexual de crianças e adolescentes, praticada por muitos, gente com ou sem poder, tornou-se a chaga aberta e a mancha envergonhada da história recente do município.

É violência contra a democracia, na medida em que a vontade do povo quase sempre é manietada pelos cabrestos desonestos da compra e da venda de votos nos pleitos eleitorais.

Na noite de 23 de setembro de 1911 o pistoleiro Hipólito, jagunço de um poderoso de Salinas, deu tiro certeiro em Martinho Rêgo, líder do povoado, a mando de Quinca Roxo, meliante que tempos antes havia sido preso por Martinho ao promover brigas na feira livre de Taiobeiras.

Em 1919, um tal Leonídio, que a história não registrou nem mesmo o sobrenome, achacava pessoas em troca de dinheiro, jurando-lhes de morte e, em alguns casos, chegando a matar mesmo. Como em filmes de faroeste, ia ao velório dos que assassinara carregando velas acesas. Teatralmente, entrava reverente na igreja em dias santos, de arma em punho, retirando as balas do “Brune” e pondo-as sobre a toalha do altar enquanto rezava. Foi assassinado por uma liga de “homens de bem” do povoado num dia de sexta-feira santa. Matou muitos. Tinha mulher e filha. O que foi feito delas ninguém sabe.

Já em 1927, como efeito colateral da “Revolução de Salinas” (Revolução ou Golpe?), quando Idalino Ribeiro depôs Juventino Nunes do comando daquela cidade sob o amparo de bandoleiros baianos por ele contratados, Maneca Primo, mercenário de Vitória da Conquista, vitorioso na terra da cachaça, retornava à Bahia. Passando por Taiobeiras com seu bando, cercou o distrito, saqueou as casas e os comércios. Fez o que quis com o povo do lugar por dias a fio. Foi detido somente quando passava por São João do Paraíso, já perto da fronteira baiana.

Em janeiro de 1981, o comerciante Tezinho Mendes foi assaltado e assassinado em sua loja de forma bárbara tornando-se um marco de um evento de latrocínio no município.

Entre 1990 e 1991, dois feminicídios estremeceram minha vizinhança. Antonina, vizinha humilde, foi morta a punhaladas pelas costas por um marido mentalmente enfermo e atormentado por uma personalidade machista. Joventina, outra vizinha, foi barbaramente assassinada e seu corpo jogado numa cisterna.

Naquele mesmo período, um frentista supostamente acusado de roubo apareceu morto com todos os traumas de tortura. Nos mesmos dias, vários corpos foram deixados na porta do cemitério sem ninguém soubesse, até hoje, a causa de suas mortes. E o terror se espalhou entre o povo taiobeirense.

A partir da última semana de 2007, na qual em poucos dias várias pessoas conhecidas foram assassinadas, uma onda violenta de assaltos, latrocínios e guerra entre gangues do tráfico de drogas tornou-se corriqueira, assombrosa e deletéria para a vida social, a paz popular e a imagem pública de Taiobeiras.

A morte do proprietário do Super Granja permanece um mistério. Jovens morrem e matam e muitos assistem, brandindo a cínica justificativa de que são envolvidos com as drogas.

Em 2012, um casal de amigos de Montes Claros bateu à minha porta pedindo ajuda porque o filho deles havia sido preso em Taiobeiras envolvido com a criminalidade. Não negavam a culpa do rapaz. Pessoas honradas e trabalhadoras, questionavam-se sobre o que de fato havia tomado de suas mãos a vida de um ente querido e a levado para o lado sombrio da violência.

E este é o drama de muitos pais e mães. A violência se entranhou como uma maldição. Tornou-se um drama moral, social, econômico e humanitário.

No povoado de Mirandópolis, em 2014, um homem foi morto, esquartejado e o assassino ainda ateou fogo aos restos mortais. Inúmeros são os outros casos de maus-tratos, torturas e mortes assombrosamente violentas de homens, jovens, idosos do meio rural mortos por parentes em busca do dinheiro da aposentadoria e de mulheres, vítimas de machismo e misoginia. Sem contar os suicídios, frutos de doenças psicológicas ou, talvez, das incompatibilidades de uma sociedade que segrega.

Conhecer essas histórias não pode nos fazer acomodar ou tragicamente nos resignar com algo que parece ser um “determinismo biológico ou geográfico”. Tomar ciência desses fatos nos deve abrir ao diálogo, acima de nossas paixões e rivalidades momentâneas, em busca de um plano audacioso de ação.

A maldade, a crueldade, o ódio e a violência não devem vencer a batalha. Que nenhum jovem se perca! Que nenhuma vida morra! O amor, o serviço fraterno, a caridade cristã e a vontade de fazer uma Taiobeiras mais justa deve nos irmanar neste momento de dor.

* Levon Nascimento é professor de História, sociólogo pela Unimontes e mestrando em “Estado, Governo e Políticas Públicas” pela Fundação Perseu Abramo e Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais.


Comentários

  1. ...esqueceram da tragédia anunciada, os perigosos ciganos!

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  2. Péssimo texto..Não falou do problema principal que são os cheiradores de cocaína que se diz dá sociedade.

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  3. E os compradores de cocaína?

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  4. Parabéns Levon,um registro triste, mas relevante para história de Taiobeiras...

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  5. Este professor falava em golpe contra a Dilma agora conprovado que ela sabia de tudo incusive até participava do caixa dois e seu idolo o Lula que foi delatado por Emilio Odebrecht que na época do sindicato ja aceitava verbinha dos empressarios quero ver este professor pedir desculpas de tantas bobagens que aqui ele publicou. Professor defende estes agora.

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